2.3.
Os Trinta e Nove Artigos da Igreja Anglicana (1563)
No
rescaldo da “Reforma Protestante”, o surgimento da Igreja da
Inglaterra (Anglicana) se deu de uma forma completamente diferente,
tendo por motivo imediato o desentendimento do rei inglês com a
Igreja Católica no que respeitava à anulação do seu casamento com
sua então esposa.
Por
isso destacamos os 39 artigos da Igreja Anglicana, já que tiveram
uma origem muito diversa dos demais.
Vejamos:
Em 1563, foi escrito o grande
documento da Reforma Anglicana: Os Trinta e Nove Artigos de Religião,
que foram aprovados pelo Sínodo (na época de Rainha Maria I, os 42
Artigos foram revogados), modificando, parcialmente, os Quarenta e
dois Artigos de Religião, documento este que demonstra a posição
doutrinal da Igreja Anglicana em relação ao Catolicismo Romano e ao
Protestantismo Reformado, sendo que evidenciou a “via média”
deste ramo do Cristianismo, ficando conhecido como “Solução de
Elizabeth”, pois Elizabeth I rejeitou o extremo de protestantismo e
catolicismo romano e procurou a terceira opção. Nesse mesmo ano, a
rainha Elizabeth I escreveu ao rei Ferdinando, regente
católico-romano da Espanha, declarando que a Igreja da Inglaterra
era a continuação da antiga Igreja Católica, mas não subserviente
ao papa: “Nós, e nossos súditos, Deus seja louvado!, não somos
seguidores de quaisquer religiões novas ou estrangeiras, mas a mesma
religião que Cristo ordena, com as antigas sanções da Igreja
Católica, as quais com a mente e a voz os mais antigos pais
unanimemente aprovaram'.”
Em 1570, o Congresso aprovou
os Trinta e Nove Artigos de Religião como o princípio que todos os
ministros ordenados, universitários e os funcionários públicos
devem aceitá-lo. Os 39 Artigos esclareceram a posição doutrinal da
Igreja Anglicana diante da Igreja Romana e da Igreja Protestante.”
“História do
Anglicanismo”, disponível no sítio virtual da Igreja
Anglicana do Brasil, em
http://anglicanchurch.weebly.com/historia.html.
O
Artigo VI trata “Da
suficiência das Escrituras Sagradas para a Salvação”,
e possui o seguinte texto:
A ESCRITURA Sagrada contém
todas as coisas necessárias para a salvação; de maneira que tudo
aquilo que nela não se lê, nem com ela se pode provar, não deve
exigir-se de pessoa alguma que o creia como artigo de fé, nem
deve julgar-se como requisito necessário para a salvação. Pelo
nome de Escritura Sagrada entendemos aqueles livros canónicos do
Antigo e do Novo Testamento, de cuja autoridade nunca houve qualquer
dúvida na Igreja. Os livros chamados comumente “Os Apócrifos,”
não formam parte das Escrituras Canónicas; e, portanto, não devem
ser usados para estabelecer doutrina alguma; nem devem ser lidos
publicamente na Igreja. Recebemos e contamos por canónicos todos os
Livros do Novo Testamento, segundo comumente são recebidos.
“Os Artigos da Religião
Cristã”, disponível no sítio eletrônico da Igreja Anglicana
Reformada do Brasil, em http://igrejaanglicana.com.br/os-39-artigos/,
sem destaque no original.
Embora
haja na expressão “tudo
aquilo que nela [a
Escritura]
não se lê, nem com ela se pode provar, não deve exigir-se de
pessoa alguma que o creia como artigo de fé”,
uma efetiva proclamação do Sola
Scriptura,
não deixa de restar certa ambiguidade da declaração em relação à
Tradição e ao Magistério da Igreja.
De
fato, aparentemente a Igreja Anglicana, na prática, não segue o
Sola
Scriptura,
tendo aderido à tríplice fonte de Escritura-Tradição-Razão,
preconizada por Richard Hooker.
Sobre
esse tema colhemos:
Toda a metodologia teológica
anglicana se estrutura a partir do tripé de Hooker: Escritura –
Tradição – Razão. O Rev. Richard Hooker viveu entre 1553-1600,
em Londres. Ele foi ordenado na Igreja da Inglaterra e,
posteriormente, nomeado pela rainha Elizabeth I como Mestre do
Templo, tornando-o capelão da “Inns of Court”, uma parte
fundamental do sistema de ensino jurídico Inglês. Depois de dez
anos ele se mudou para uma paróquia país perto de Canterbury, onde,
nos restantes cinco anos de sua vida, ele conseguiu pôr em marcha a
sua magnum opus “As Leis da Política Eclesiástica”.
Esta obra marcou profundamente o pensamento inglês, influenciado
inclusive o surgimento do liberalismo de John Look (1632-1704) que a
cita diversas vezes. A obra de Hooker foi a primeira defesa
sistemática da doutrina da Igreja da Inglaterra após a separação
com Roma e por isso ele é considerado o primeiro grande teólogo
anglicano. Até mesmo o Papa Clemente VIII (1536-1605) ficou
impressionado com seu trabalho.
A obra de Hooker é amplamente
reconhecida por afirmar que a teologia anglicana é baseada na
“Escritura, Tradição e Razão”, indo tão longe a ponto de
criar uma analogia com um “banquinho de três pernas”.
Ricardo, Rodson, “O que é
Anglo-Catolicismo?”, disponível no endereço eletrônico
http://grupojovemanglicano.blogspot.com.br/p/anglo-catoliscimo.html.
E
ainda:
Escritura-Tradição-Razão: o
Tripé de Hooker
O Rev. Richard Hooker,
sacerdote inglês do século XVII, tem muito a contribuir ao modo de
se fazer teologia anglicano. Na sua época, havia várias
controvérsias de ordem teológica, as quais ele abordou de forma
criativa e conclusiva.
Quanto ao papel das Escrituras
Sagradas, Hooker evitou os dois extremos: a posição romana de que
as Escrituras são insuficientes e que a Tradição deve suprir a
insuficiência e a posição puritana de que é pecaminosa e
ilegítima a liberdade da Igreja tomar decisões sobre o que as
Escrituras silenciam.
Hooker refletiu sobre essa e
outras matérias como fizeram seus contemporâneos levando em
consideração a Bíblia, a Tradição, principalmente, a Igreja
Primitiva, (a interpretação contínua das Escrituras, sua
aplicação), e a Razão (o bom senso, o senso comum de um povo em
determinado tempo e lugar, a capacidade humana de simbolizar,
ordenar, compartilhar e comunicar a experiência).
Com Hooker e outros e com os
Artigos houve a possibilidade de desenvolver a leitura crítica,
histórica, contextual, e teologicamente trinitária e pastoral.
Takatsu,
Sumio, “Existe
uma teologia caracteristicamente anglicana?”,
disponível no sítio eletrônico da Igreja Episcopal Anglicana do
Brasil, endereço eletrônico
http://www.ieab.org.br/ieab/index.php?option=com_content&task=view&id=33.
Considerando
o exposto, a Igreja Anglicana, apesar de aparentemente haver
proclamado o Sola
Scriptura,
não o adota efetivamente.
Continua...